Conteúdos em plataformas de streaming geram crise nos cinemas tradicionais
Com a possibilidade de assistir a filmes e séries sem sair de casa surgem especulações sobre o fim das salas de exibição
Por Cadu Franco
A popularização dos serviços de streaming redefiniu a forma de consumir o conteúdo digital na última década. Levantamento da empresa americana Roku , em fevereiro de 2022, mostra que sete em cada 10 brasileiros gostam mais de assistir a filmes em suas residências do que de ir ao cinema.
A Netflix, plataforma mais popular, iniciou há 27 anos como serviço de aluguel de filmes e, em 2007, expandiu para o streaming. Antes exibia filmes que não eram inéditos e atualmente produz séries e filmes exclusivos.
Com os efeitos da pandemia, as salas de cinema ficaram vazias devido ao isolamento social e a busca por serviços de streaming cresceram 300% nos últimos dois anos, segundo a pesquisa da corporativa RankMyApp , divulgada em setembro de 2021
O cineasta Glauber Gomes, professor do curso de Jornalismo, da Universidade de Fortaleza, afirma que o cinema de shopping é uma rede que ainda sobrevive em virtude da experiência. “As pessoas não saem de casa somente para assistir a um filme. Saem para comer numa praça de alimentação, passear no shopping, poder comprar roupa. O cinema de shopping resiste, pois além de fazer uma seleção de filmes, ele está alinhado a tudo aquilo que o shopping oferece”, comenta.

A cinéfila e assistente social, Ana Durcila, relata que assiste mais aos filmes em casa por conta da praticidade e economia. É mais viável financeiramente assinar um serviço de streaming e ter acesso a vários filmes do que ir ao cinema e assistir apenas um. Ela afirma, porém, que a experiência é diferente. “Acho que assistir a filmes no telão dentro da sala de exibição não vai ser substituído, apesar de estar dentro de casa ter mais comodidade”.
Para o professor, o hábito de ir assistir a um filme presencialmente ficou como segundo plano para muitos, mas enfatiza que ainda sim, ir ao cinema é um evento importante e que não tem previsão para o fim. “Não acho que é uma coisa que vai acabar. Vai entrar numa certa evolução tecnológica desse ramo de experiência, mas não vai ser o que era antes.”
Os cinemas de bairro
Apesar dos cinemas de shoppings continuarem sobrevivendo, outros serviços de exibição cinematográfica desapareceram com as novas possibilidades tecnológicas. Em 2021, a “Distrivídeo”, última locadora de filmes de Fortaleza, fechou as portas após 34 anos, e o mesmo aconteceu nas décadas passadas com os cinemas de bairro.
O Cine Nazaré, que tinha como responsável o Seu Vavá, falecido no dia 22 de fevereiro passado, foi o último cinema de bairro do Brasil e, segundo Gomes, resistiu somente por iniciativa do dono. Localizado no bairro Parque Araxá, o cinema foi um espaço de exibição de filmes culturais por mais de 80 anos.

Assim como o Cine Nazaré, outros cinemas de bairro como o Cine Familiar, Cine Jangada e Cine Diogo fizeram parte da cultura e lazer das famílias fortalezenses. Com o tempo, foram perdendo espaço para os cinemas de shopping e substituídos pelas novidades tecnológicas, cita o cineasta.
O fotógrafo Alcides Freire , que conheceu o Seu Vavá, salienta a importância do cinema de bairro para a sociedade. “Permite às pessoas separadas dos grandes centros comerciais, por questões financeiras, por exemplo, terem acesso a esta arte e entretenimento, que penso ser imprescindível, para formação cultural de todos”.
O cinema está constantemente inovando seus efeitos visuais e sonoros. Glauber ainda afirma que a experiência tecnológica estará sempre presente. “Ainda vai ter inovação nas salas de cinema, sempre vai continuar tendo. Talvez não com o número do público que tinha antes”. Sobre o Cine Nazaré’, ele destaca: ”A iniciativa do Seu Vavá era de valor simbólico e cultural, como uma representação do que foi o cinema de bairro, e cumpria um lugar de nostalgia. A partida dele é uma partida simbólica desse lugar”, conclui.
Foto em destaque: Pixabay